Suplemento Pernambuco

LITERATURA BRASILEIRA E OS TEMPOS DA DITADURA
Ricardo Lísias
edição 77

Trecho:

Em 1988, Elvira Vigna estreou com o romance Sete anos e um dia, que lida justamente com os anos de redemocratização. O livro já traz a aspereza narrativa que seria sua marca, aplicada aqui ao olhar agudo dirigido a uma sociedade que enxergava todos os acontecimentos históricos, por mais importantes que fossem, com certa frivolidade festiva. O livro ainda observa bem como o Brasil parecia anestesiado depois dos anos de ditadura, sem conseguir enxergar o próprio estado de torpor. Dali em diante Vigna desenvolveria uma obra voltada para a observação detalhada de indivíduos emparedados entre uma sociedade inoperante e a necessidade, imperiosa e incontornável, de que algo fosse feito.

Um pouco antes, Zulmira Ribeiro Tavares havia lançado o escandaloso e eficaz O nome do bispo, com uma sátira marcante aos assim chamados “quatrocentões”. Em comum com Elvira Vigna há a crítica violenta à frivolidade de estratos sociais que não conseguem enxergar exatamente o lugar de onde falam e menos ainda o papel que ocupam na violência (não apenas simbólica) com que a sociedade brasileira sempre fundou suas diferenças de classe. A distinção, menor do que uma primeira olhada aos textos pode dar a impressão, está na forma como a crítica é composta. Para a estreante, a contenção no riso serve para aprofundar o desprezo; já para Zulmira, a gargalhada aumenta a zombaria. No final, as duas estão expondo a fragilidade de grupos sociais que ocupam lugares de poder, sejam eles econômicos, políticos ou mesmo culturais, não por seus talentos, mas meramente por conta da família em que nasceram. O Brasil sempre admirou os filhos de pais famosos: sobrenome é um bem muito valioso entre nós.